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RENAN MARCEL

Quando a crítica política vem sem rosto

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No debate político tradicional, é comum que a crítica perca força quando o mensageiro é descredibilizado. Atacar quem faz a crítica (e não o que foi dito) é uma estratégia antiga. Como repórter de política vi acontecer inúmeras vezes. A lógica é simples: se você desacredita o emissário, neutraliza a mensagem. Mas e se o emissário não tiver CPF, partido, nome, nem rosto? 

Vamos lá: Imagine uma multidão nas ruas, com cartazes e gritos de ordem. A cena é filmada de vários ângulos, tem emoção, tem narrativa, parece real. Mas não aconteceu. Tudo foi gerado por inteligência artificial. É ao mesmo tempo genial e assustador para quem estudou comunicação. A crítica que antes vinha de um rosto conhecido, de um cidadão real, agora pode vir de um emissário fictício, sem histórico, sem identidade, sem passado. Isso muda tudo.

Muda porque esse conteúdo não deixa brechas para ataques pessoais. Circula livre, sem passado que o condene. Não há o que cancelar ou quem cancelar. E se houver processo, provavelmente não haverá o mesmo interesse.

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Outro aspecto relevante é a velocidade com que essas críticas se espalham. Mesmo que uma peça tenha sido criada por alguém com uma intenção específica, ela pode ser remixada, replicada, ressignificada por outros. Em pouco tempo, o que era uma encenação ganha força de opinião pública. Se a mensagem toca em sentimentos reais, como indignação, frustração, desconfiança, ela encontra terreno fértil para crescer.

A linha entre representação simbólica e manipulação deliberada nunca foi tão tênue. E ficam os questionamentos: se a crítica gerada por IA representa algo que uma parte da população realmente sente, ela é menos legítima por ser encenada? Ou mais poderosa justamente por conseguir traduzir o sentimento coletivo?

Essas perguntas abrem um novo capítulo na relação entre comunicação e democracia. Estamos diante de um novo tipo de narrativa política, que não precisa mais acontecer de verdade para funcionar. É ficção? É marketing? É protesto digital? Talvez seja tudo isso ao mesmo tempo e o grande dilema aqui talvez não seja político, mas ético.

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Renan Marcel é jornalista em Cuiabá. 

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